FÚRIA EM TEMPO DE PANDEMIA
Toque,
tocar.
Eu me toquei.
Toquei em meu peito,
toquei os meus braços,
toquei meu ventre,
fui tocando cada parte
minha.
Me tocando,
me desfazendo e
refazendo.
Não necessariamente em
uma sequência lógica e linear.
Na busca de sentimentos
e sensações.
A introspecção assim
como a arte são minhas aliadas.
Sou minha morada.
Toquei mais forte,
até ficar vermelha,
até ter súbitas e
profundas ideias e atos de consciência.
Tive raiva.
Por que o espanto leitor?
A raiva é legítima,
assim como o amor,
alegria.
Reivindico o direito a
raiva, indignação, revolta.
Tive tanta raiva, que
meu corpo estremeceu.
Depois foi aparecendo
outros sentimentos.
Eles foram chegando,
sentando e intensificando.
A fúria me invadiu.
Peguei uma xicara de café
e iniciei as leituras.
Em meio uma crise de
saúde,
li tantos absurdos,
quanto mais lia,
a fúria virava um lobo
feroz.
Será que o mito se
alimenta de estupidez e insanidade no café da manhã?
Até quando o absurdo e
estupidez serão tratados como normais?
Essa normalidade do anormal,
violento,
tem preço alto para a
civilização e democracia.
Me compadeço da
democracia,
ela parece uma criança,
pequena, impotente,
esperançosa, especial,
suplicando para ser
protegida e cuidada,
mas esses ferozes a massacram,
massacram como em 1964,
como em 1914,
em 1939.
O ódio, autoritarismo
ainda sobrevivem,
fazendo adeptos,
vítimas e deixando rastros de destruição.
A cada gole de café,
página lida,
reflexão,
me toquei do quão a
existência é breve e caótica,
o medo do desconhecido
e a mudança de rotina,
percursos mexem tanto
conosco.
Cadê liberais seu deus
economia?
Cadê conspiradores,
anti intelectuais,
a salvação sem o uso da
ciência?
E vocês reacionários?
Como ousam afirmarem
que o SUS é inútil?
Que as Universidades
Públicas são imprestáveis?
Vocês são tão
ridículos, insanos.
Desculpe, senhor
Samarago,
ainda somos ilhas insistindo,
presos nas zonas de conforto.
Desejamos ser
navegantes,
entretanto há aqueles
que temem mergulhar em si.
Vivem em eternos
espaços ilusórios, confortáveis de certezas absolutas e irreais.
A natureza, o finito, a
morte,
a fragilidade reinam e
dão risada da raça humana,
de nossa pequenez e
prepotência.
Eu estava em busca,
como se dentro,
houvesse uma estrada,
como se dentro houvesse
algo,
algo que possibilitaria
acender a chama,
o elixir, a resposta.
Ou será fora a estrada?
Não me pergunte,
se a resposta seria a
estrada,
se a estrada seria mais
dilemas,
possibilidades ou meio
de fuga,
era só uma estrada,
acreditei,
que essa viagem,
o caminhar poderia
mover,
deslocar,
de certa forma sim,
mas para quem não se
resolveu com o passado,
nenhum caminho,
remédio,
drogas, multidão,
serão soluções, serão
só distrações,
fugas momentâneas,
perigosas,
temporárias,
que num instante serão
apagadas,
dissipadas.
Sendo substituídas pelas
dores, problemas, traumas, angústias,
que estão ocultadas,
escondidas.
Ó tolo!
Como ousas subestimar
seus ferozes medos?
Medos de incertezas,
das mudanças,
da morte, da
incapacidade,
da derrota, do
abandono,
da solidão, do
desafeto,
da violência.
Como ousas?
Você é tão covarde e
cruel,
que se esconde,
se esconde entre a
multidão,
que corre e se esconde
entre ruas,
escuros,
se esconde no meio
virtual,
entre telas, emoticons,
páginas,
gritos de vaidade, auto
afirmação e grosseira.
Versões famintas,
irracionais, reais,
enfurecidas, que você
insiste em negá-las.
Você nega a dor, o
medo,
como um pai nega afeto ao filho.
Você nega a realidade,
como o cético, fanático
nega evidências.
Você continua negando,
se auto sabotando,
tentando a fuga,
a negação,
mas eles continuam aí,
a verdade não se
altera,
mesmo que você insista
nas mentiras.
Nada mudou,
pois você não permitiu
mudanças,
Como elas foram embora
se a porta continuava fechada?
Até sua mente está
enclausurada.
Como ousas negar,
correr do que estar aí?
Como elas se foram?
Afinal nunca sentamos a
mesa,
nunca tivemos um
diálogo,
não houve acordos,
transparência.
Você poderia ser um
mar,
um pássaro.
Você poderia,
poderia tanto,
mas preferiu ser
estático,
raso,
comum.
Você poderia...
Rogelânia Bezerra graduada em Letras/Português pela Universidade Estadual do Ceará. Leitora, escritora, pesquisadora e ativista.
💓💓💓💓💓
ResponderExcluirObrigada! <3 <3
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