Poema: Como desaparecer completamente (How to disappear completely)

(Fotografia de Thalya Amancio, FECLESC, campus da UECE, 2020)



Como desaparecer completamente, 

Digo eu, penso eu.

Sendo mais do que simplesmente imagem tecnológica, analógica, digital.

SENDO, 

VIVENDO,

SENTINDO.


Desaparecer mesmo?

Ou se tornar alguém mais vivo para além do caos instalado? 

Como então desaparecer completamente?


Nunca desapareceremos.

Nunca é uma palavra férrea, real. 

Real por fazer-se presente, ser-se.


Por muitos dias, anos, eu rodopiei, fugindo do real.

Agora necessito é de tornar-me 

EU

Desparecer do vazio, do superficial. 

Antropofargiar a mim mesma, novamente.


Na minha caminhada de retirante, viajante, 

é um vai-e-vem de trocas, quebras, de retornos.

Não, não és tu, cobra Ouroboros. 

Não és o retorno ao mesmo, a mim mesma, antiga,

antepassada, 

é uma volta diferente, ressiginificada. 


É preciso reinventar-se.

Daí o desaparecer-se. 

Como então desaparecer completamente?

Não sei. Nunca tentei.

Acredito ser até impossível. 


És inevitável fugir de nós mesmos

e do que nos constitui. 

Somos, sem mais:

átomos, partículas, sistemas, universos em um só.

Somos. 


Não há como desaparecer completamente? 

Não. Seremos depois do retorno, depois do 

FIM desses corpos.

Corpos vulneráveis. 

Ainda seremos. 



Então... 

Deixe-me vagar...

Vaguemos. 

Renovemo-nos,

com fogo, ferro, água, terra... 

Renovemo-nos,

reconstruama-nos

ardentemente.


Deixa envolver-me,

inundar-me nas águas 

ondulantes de minh'alma.


Minh'alma concreta, material, 

ansiosa por sentir além de viver no mundo digital.


Este mundo que parece ouro falso. 


Então, como desaparecer completamente?

Não desapareça. 

Renove-se. 

Recrie-se. 


Antrofargir-se a ti. 

Da transformação surgirá uma nova PELE. 


(Fotografia de Thalya Amancio)



Sugestões: ouçam a canção "How to disappear completely" do Radiohead. Estava refletindo sobre o quanto as redes sociais podem ser prejudiciais na compreensão de nós mesmos, por isso, importante se desvincular por alguns momentos, para se perceber.  

E essa música mostra, pela minha interpretação e extrapolação dela, que mesmo sentindo medo, angústia e tristeza, negar as nossas sensações não é a melhor solução. Montar paredes, muros contra o que somos, é meramente uma fuga da realidade. Funciona de início quando estamos em choque, mas depois precisaremos arcar com as consequências e mitigar mais sofrimentos. E como escreveu Lygia Fagundes Telles, "já que é preciso aceitar a vida, que seja então corajosamente".

Em breve trarei a resenha de algumas leituras e projetos que realizei durante esse momento de Pandemia (não tem lado positivo, obviamente). 

Por ora, voltarei para as minhas antropofagias.



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